O que eu Prego
É uma grande coisa já começar a vida
Cristã crendo em boa e sólida doutrina. Algumas pessoas têm recebido vinte
diferentes "evangelhos" neste mesmo número de anos;
e quantos mais irão aceitar antes que sua jornada termine é difícil de dizer.
Dou graças a Deus por Ele logo cedo
ter me ensinado o evangelho, e tenho estado tão perfeitamente satisfeito com
ele, que não quero conhecer nenhum outro.Porque, se eu cresse no que alguns
pregam sobre uma salvação temporária, e sem importância, que somente dura por
um tempo, eu raramente seria grato por ela, se é que seria; mas quando sei que
aqueles que Deus salva, Ele os salva com uma salvação eterna, quando sei que
Ele lhes dá uma justiça eterna, quando eu sei que Ele os assenta em uma
fundação eterna de amor eterno, e que Ele os trará ao Seu reino eterno, oh,
então me admiro, e me surpreendo pelo fato de uma bênção tal como esta tenha,
em algum momento, sido dada a mim!Suponho que haja algumas pessoas cujas mentes
naturalmente se inclinam em direção à doutrina do livre-arbítrio. Eu posso
somente dizer que a minha se inclina naturalmente em direção à doutrina da
graça soberana.
Algumas vezes, quando vejo algumas
das piores personalidades na rua, eu sinto como se meu coração devesse jorrar
em lágrimas de gratidão, porque se Deus me tivesse deixado só e não me tivesse
tocado por Sua graça, que grande pecador eu teria sido! Eu teria ido aos
extremos do pecado, mergulhado nas maiores profundezas do mal, também não teria
reprimido qualquer vício ou loucura se Deus não me tivesse restringido. Eu
sinto que eu teria sido o próprio rei dos pecadores, se Deus me tivesse deixado
só.Eu não consigo entender a razão pela qual sou salvo, exceto sobre a base de
que Deus queria que isto fosse assim.
Eu não posso, se olhar sinceramente,
descobrir qualquer tipo de razão em mim mesmo pela qual eu deva ser um
participante da graça Divina. Se não estou neste momento sem Cristo, é somente
porque Cristo Jesus tem Sua vontade para comigo, e que esta vontade é que eu
deveria estar com Ele onde Ele estiver, e que deveria partilhar da Sua glória.
Não posso por a coroa em nenhum outro lugar exceto sobre a cabeça Daquele cuja
poderosa graça tem me salvado de seguir abaixo para o abismo. Foi Ele que
transformou meu coração, e me colocou de joelhos diante de Si.Posso bem me
lembrar da maneira pela qual eu aprendi as doutrinas da graça em um único
instante. Nascido, como todos nós somos por natureza, um arminiano, ainda cria
nas velhas coisas que tinha ouvido continuamente do púlpito, e não via a graça
de Deus. Quando estava vindo a Cristo, pensei estar fazendo aquilo tudo por mim
mesmo, e ainda que buscasse o Senhor sinceramente, não tinha idéia de que o
Senhor estava me buscando.
Não penso que o novo convertido
esteja, a princípio, consciente disto. Eu posso relembrar o dia e a hora exatos
em que pela primeira vez recebi aquelas verdades em minha própria alma, quando
elas foram, como diz John Bunyan, gravadas em meu coração como com um ferro em
brasa; e eu posso recompor como me senti quando cresci repentinamente de um
bebê para um homem que havia feito progressos no conhecimento das Escrituras,
por ter encontrado, de uma vez por todas, a chave para a verdade de Deus.Em uma
noite de um dia de semana, quando estava sentado na casa de Deus, não estava
pensando muito sobre o sermão do pregador, porque não cria nele. Um pensamento
me tocou: "Como você veio a ser um Cristão?" Eu vi o Senhor.
"Mas como você veio a buscar o Senhor?" A verdade lampejou por minha
mente em um momento, eu não poderia tê-lo buscado a menos que tivesse havido
alguma influência prévia em minha mente para me fazer buscá-Lo. Eu orei, pensei
eu, mas quando perguntei a mim mesmo, como eu vim a orar? Fui induzido a orar
pela leitura das Escrituras.
Como eu vim a ler as Escrituras? Eu
as havia lido, mas o que me levou a assim proceder? Então em um instante, eu vi
que Deus estava na base disto tudo, e que Ele foi o Autor da minha fé, e assim
toda a doutrina da graça se tornou acessível a mim, e desta doutrina eu não me
afastei até hoje, e desejo fazer desta, a minha confissão perpétua: "Eu
atribuo minha conversão inteiramente a Deus".Certa vez compareci a um
culto aonde o texto veio a ser: "[Ele] escolherá para nós a nossa
herança"(1) e o bom homem que ocupou o púlpito era
mais do que apenas um pouco arminiano. Por esta razão, quando começou, ele
disse: "Esta passagem se refere inteiramente à nossa herança temporal, não
tem nada a ver com nosso destino eterno, porque", disse ele, "nós não
queremos que Cristo faça por nós a escolha do Céu ou do inferno. Isto é tão
claro e direto, que cada homem que tenha um grão de senso comum irá escolher o
Céu, e nenhuma pessoa será tão desajuizada que escolha o inferno.
Não temos qualquer necessidade de
alguma inteligência superior, ou de qualquer grande Ser, para escolher Céu ou
inferno por nós. Isto é deixado para o nosso próprio livre-arbítrio, e temos
bastante sabedoria dando-nos meios suficientemente corretos para julgar por nós
mesmos," e, portanto, como ele muito logicamente inferiu, não há
necessidade de Jesus Cristo, ou de qualquer outro, fazer a escolha por nós. Nós
podemos escolher a herança por nós mesmos sem qualquer assistência.
"Ah!" eu pensei, "mas,
meu bom irmão, pode ser mesmo verdade que nós podemos, mas penso que precisamos
querer algo mais que o senso comum antes que possamos escolher
corretamente".Primeiro, deixe-me perguntar, não devemos todos nós admitir
uma soberana Providência, e a designação da mão do SENHOR, como os meios
através dos quais nós viemos a este mundo? Aqueles homens que pensam que,
depois de tudo, nós somos deixados ao nosso próprio livre-arbítrio para
escolher este ou aquele para direcionar os nossos passos, deve admitir que
nossa entrada neste mundo não aconteceu por nossa própria vontade, mas que Deus
teve, naquela hora, que escolher por nós.
Que circunstâncias foram aquelas, sob
de nosso controle, que nos direcionaram a eleger certas pessoas como sendo
nossos pais? Tivemos nós alguma coisa a ver com isto? Não foi o próprio Deus
que determinou nossos pais, nosso local de nascimento, e amigos?John Newton
costumava contar uma parábola sobre uma boa mulher que, de modo a provar a
doutrina da eleição, dizia: "Ah! meu caro, o Senhor deve ter me amado
antes de eu nascer, ou caso contrário Ele não teria visto nada em mim para amar
depois". Estou certo que é verdade no meu caso; Eu creio na doutrina da
eleição, porque estou bem certo que, se Deus não me tivesse escolhido, eu nunca
O teria escolhido; e tenho certeza que Ele me escolheu antes de eu nascer, ou caso
contrário Ele nunca teria me escolhido depois; e Ele deve ter me eleito por
razões desconhecidas por mim, porque eu nunca pude encontrar qualquer razão em
mim mesmo pela qual Ele devesse me olhar com especial amor.Se seria admirável
ver um rio brotar da terra já crescido, tanto mais seria olhar pasmado para uma
vasta fonte da qual todos os rios da terra saíssem borbulhando de uma só vez;
um milhão deles nascendo em um só nascimento? Que visão haveria de ser! Quem
pode concebê-la.
E ainda assim o amor de Deus é aquela
fonte, formando cada um dos rios de misericórdia, os quais têm sempre
satisfeito nosso povo com todos os rios de graça durante o tempo, e de glória
depois de subirem. Minh'alma, permaneça naquele manancial sagrado, e adore e
exalte para todo o sempre a Deus, nosso Pai, que tem nos amado! Bem no início,
quando este grande universo estava na mente de Deus, como florestas não
nascidas na semente do carvalho; muito antes que os ecos acordassem os ermos;
antes que as montanhas fossem geradas; e muito antes que a luz rompesse pelo
céu, Deus amou estas criaturas escolhidas. Antes que houvesse qualquer ser
criado, quando o éter ainda não havia sido agitado pelas asas do anjos, quando
o próprio espaço ainda não tinha existência, quando não havia nada exceto Deus
somente, mesmo então, naquela solidão de Deidade, e naquela penetrante quietude
e profundidade, Seu coração se moveu com amor por seus escolhidos. Seus nomes
estavam escritos em Seu coração, e então eram eles queridos de Sua alma. Jesus
amou Seu povo antes da fundação do mundo, mesmo da eternidade! E quando Ele me
chamou por Sua graça, me disse: "Porquanto com amor eterno te amei, por
isso com benignidade te atraí"(2). Se qualquer um me perguntasse o que eu
entendo por um Calvinista, eu responderia: "Ele é alguém que diz: Salvação
do Senhor".
Eu não consigo encontrar nas
Escrituras nenhuma outra doutrina além desta. É a essência da Bíblia. "Só
ele é a minha rocha e a minha salvação"3. Me diga
qualquer coisa contrária a esta verdade, e será uma heresia; diga-me uma
heresia, e eu acharei sua essência aqui: que ela se afastou desta grande, desta
fundamental, desta firme verdade, "Deus é minha rocha e minha
salvação".Qual é a heresia de Roma, além da adição de algo aos perfeitos
méritos de Jesus Cristo, o acréscimo de obras da carne, para auxiliar em nossa
justificação? E qual é a heresia do arminianismo além de adicionar algo à obra
do Redentor? Cada heresia, se trazida à pedra de toque, irá se descobrir
aqui.Eu tenho minha própria opinião particular de que não há tal coisa como
pregar Cristo e Ele crucificado, a menos que nós preguemos que nos dias de hoje
isto é chamado de Calvinismo. É um apelido chamar a isto de
Calvinismo; o Calvinismo é o evangelho, e nada mais. Eu não creio
que podemos pregar o evangelho, se não pregarmos a justificação pela fé, sem
obras; nem sem pregarmos a soberania de Deus e Sua dispensação de graça; nem
sem exaltarmos a eleição, pelo inalterável, eterno, imutável, conquistador amor
do SENHOR; nem penso que podemos pregar o evangelho, a menos que o baseemos
sobre a especial e particular redenção de Seu povo eleito e escolhido o qual
Cristo formou sobre a cruz; nem posso eu compreender um evangelho que deixa
santos decaírem após serem chamados, e sujeitar os filhos de Deus a serem
queimados no fogo da condenação após terem uma vez crido em Jesus. Tal
evangelho eu abomino.Não há alma viva que defenda mais firmemente as doutrinas
da graça que eu, e se algum homem me pergunta se porventura me envergonho de
ser chamado Calvinista, respondo que eu não quero ser chamado de nada além de
Cristão; mas se você me perguntar, eu defendo a visão doutrinária que foi
defendida por João Calvino, eu replico, estou no centro de sua defesa, e estou
feliz por professá-la.Mas, longe de mim, sequer imaginar que Sião não contém
nada além de Cristãos Calvinistas dentro de seus muros, ou que não há ninguém
salvo que não defenda nossa visão.
Creio que há multidões de homens que
não conseguem ver estas verdades, ou, pelo menos, não conseguem vê-las do modo
em que nós as colocamos, mas que não obstante, têm recebido a Cristo como seu
Salvador, e são tão queridos do coração do Deus de graça como o mais ruidoso
Calvinista dentro ou fora do Céu. Frequentemente é dito que estas doutrinas nas
quais nós cremos têm uma tendência de nos levar ao pecado.
Eu tenho ouvido isto ser declarado
muito positivamente: que aquelas grandes doutrinas que amamos, e que
encontramos nas Escrituras, são licenciosas. Não sei quem terá a audácia de
fazer esta afirmação, quando considerar que os mais santos dentre os homens têm
crido nelas. Pergunto ao homem que se atreve a dizer que o Calvinismo é uma
religião licenciosa, o que ele pensa do caráter de Agostinho, ou de Calvino, ou
de Whitefield, que em sucessivas eras foram grandes expoentes do sistema da
graça; ou o que diria dos Puritanos, cujas obras estão cheias delas? Se um
homem tivesse sido um Arminiano naqueles dias, teria sido considerado o mais
vil herege vivente, mas agora nós somos vistos como hereges, e eles como
ortodoxos.Nós temos retornado à velha escola; nós podemos traçar nossa linhagem
desde os apóstolos.
É aquele veio de livre-graça,
correndo através da pregação de Batistas, os quais nos têm salvado como
denominação. Não é por isto que nós não podemos permanecer onde estamos hoje.
Nós podemos correr uma linha dourada até o próprio Jesus Cristo, através de uma
santa sucessão de vigorosos pais, todos os quais defenderam estas gloriosas
verdades; e podemos perguntar a seu respeito: "Onde você encontraria
homens melhores e mais consagrados no mundo?".
Nenhuma doutrina é tão planejada para
preservar o homem do pecado quanto a doutrina da graça de Deus. Aqueles que a
têm chamado de "doutrina licenciosa" não sabem nada a seu respeito.
Coisas pobres da ignorância, eles mal souberam que seu próprio material ruim
foi a mais licenciosa doutrina sob o céu. Se eles conhecessem a graça de Deus
em verdade, eles logo iriam ver que não houve nada que preservasse mais da
queda que o conhecimento de que somos eleitos de Deus desde a fundação do
mundo. Não há nada como a crença na perseverança eterna, e na imutabilidade da
afeição de meu Pai, que possa me manter mais perto Dele, pela simples razão da
gratidão. Nada faz um homem mais virtuoso que a crença na verdade.
Uma mentira doutrinária irá logo
produzir uma prática mentirosa. Um homem não pode ter uma crença errada sem em
algum momento futuro ter uma vida errônea. Eu creio que uma coisa naturalmente
leva à outra.De todos os homens, os que têm a mais desinteressada piedade, a
mais sublime reverência, a mais ardente devoção, são aqueles que crêem que são
salvos pela graça, sem obras, através da fé, e não de si mesmos, a qual é dom
de Deus.4Os Cristãos devem ter cautela, e ver que isto sempre é assim, a fim de
que por quaisquer meios Cristo não seja novamente crucificado, e exposto ao
vitupério5.
LucioFidalgo
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